quarta-feira, 23 de junho de 2010

ADEUS

Ao longe desaparece no horizonte a terra amada, o cantinho humilde onde eu nasci.
E embarco nesta pátria de ferro sobre o mar deitada e lenta, ao sabor das ondas a balançar.

E ao meu perdido elo que aos pés do chão abandonei já nem o lamento tanto, pelo muito que já o chorei!

Deserdado da pátria e do ninho onde nasci e de onde muito cedo parti nas primeiras horas de uns dias que aí vivi, que de tão feliz nem vi passar!

Olho agora em frente e vejo mar, olho à direita e só vejo a água tediosa a balançar.
E se olho à esquerda só vejo as ondas sem nenhuma graça a dançarem.

Mas se já é noite, no céu apenas estrelas em silêncio e de fraco brilho a estrelar.
E o tédio tenebroso, para onde me ponha a olhar!

Mas já não vejo distantes os olhos de bem querer de minha mãe zelosa a reparar, senão um lenço na memória que ficou pra trás no tempo cais a me acenar.
Onde vai dar esta estrada oceânica, onde vai ter o meu destino só?

Onde vou reencontrar a minha já perdida infância, nesta caixa de ferro e de agonias a sepultar meu fado, e as minhas fantasias?
Não sei.

Quem dera entender do céu o seu desígnio, ah, pudesse eu adivinhar o meu futuro e o meu destino!

Não andaria assim perdido em tempo escuro dentro de um caos de ferro e negro muro.
Dentro de mim, sim, eu sei que vou e ainda bem, pois aonde vá dentro do peito aquietado e quente eu sempre estarei, enquanto viva!

Mas ainda assim olho ao longe e não sei onde vai dar este caminho, nem sei quem sou a seguir por esta estranha via.

De meu perdido chão da infância tenho as marcas gravadas, em meus pés descalços.
E em minhas mãos ingênuas as lembranças dos meus poucos dias lá na aldeia, e poucas, mas também belas manhãs.

Só nos olhos tristes o adeus de quem ficou no tempo e na memória, é no peito agora a marca de um pedaço que rasgado se perdeu.

Apesar do canto da cigarra e das promessas de vitória...

Nada, nada logrará preencher a rasgada página mais bela de minha história, deixada a um canto da infância.

E se aí não houve feitos de boa memória, por que insiste em se fazer em mim em viva história?

Liberta-me então do vício da lembrança, liberta-me do tempo que passou!
Devolve-me a perdida liberdade e livra-me deste fado de lembrar quem já não sou!

Liberta-me do medo ancestral, revela-me o segredo que ninguém me quer contar!

Livra-me para sempre das infalíveis verdades humanas e das suas vitórias a sangrar!

Despidas de lealdade, ó mentiras que encenam de bandeiras desfraldadas!

Também por isso livra-me de mim, e da vontade de voltar na infância àquele espaço tempo já morto sem ser já qualquer lugar!

quarta-feira, 16 de junho de 2010

CIDADE PERDIDA

Terminda a série "Desesperança" segue esta com algumas postagens de a "CIDADE PERDIDA"


Já distante no tempo e de remota idade lá na aldeia, na minha cidade ainda inacabada gastei as iniciais reservas de energia e de luz, com as quais poderia terminar a demarcação física e cultural do projeto fincando no chão a minha original cruz.

Ainda assim dei-lhe inicio, mas não terminei a ideia decorativa com as características da região de minha cidade.

Mesmo que se trate de uma obra com principio universal, meio e fim de servir deveras a elevada finalidade.

A cidade que mal edifiquei e ficou sem a luz pátria logo no começo devido uma viagem para longe que tive de fazer, lhe dei original inicio, e por isso já tem hoje real endereço.

Apesar de fracas as suas fundações porque fossem os materiais modestos, dotei-a das mais modernas instalações e os seus propósitos são de fato muito honestos.

Nunca pensei apesar de refinado sonhador fazê-la de sonho; pois que às vezes o sonhar vira pesadelo.

Nem quero minha cidade do espanto a causar medo, embora nela colocasse algum mistério e um pessoal segredo.

Mesmo não a tendo acabado com os valores aldeões e não sendo um encanto, é a minha inacabada cidade feita de tempo, sem luxo, mas com o mais elevado enlevo.
A minha cidade mesmo inacabada, é, porém destinada a pacificar sem dogma nem credo de nenhuma cor.

E apesar de não ser luxuosa, em homenagem à vida em todas as formas a vai a consagrar e celebra-se aí também o amor.

E é com poucos recursos, que muitos não há, mas é com o que de melhor a vida tem e nos dá.

A minha cidade é caiada de branco por fora e cortada por um rio e muitos regatos.
E ainda nela não se instalou nenhum banco, nem financeira que explore o trabalho.

Apesar de pequena, tem grande floresta e muito rica fauna; e ao homem triste que por ela passa um sorriso lhe presta, aos feridos socorre e aos pobres consola.

A minha cidade? É a minha cidade! Mas não é exatamente uma cidade com a marca da rés pública!

E apesar de inacabada naquela etapa inicial tem já certo tempo de vida!

E se me ausento dela em devaneios quanta perda de tempo, pois é este o meu pessoal projeto que herdei do Eterno.

E é externamente da pátria a extensão, e assisto por ela chorando perder-se em mentiras e desmando a rica pobre nação!

Ainda não sabem o que é, nem onde fica, a minha cidade?

Bem, ela tem nove portas e na principal originalente tem trinta e dois portais...

Dizem que são os trinta e dois portais do conhecimento...

quarta-feira, 9 de junho de 2010

ILUSÃO

Andei por muitas ruas e avenidas, passei por muitos lugares dos quais guardo ainda na memória resquícios daquele meu andar. Só não sei quem era aquele eu, que hoje emprego na primeira pessoa.

Em cada esquina deixei escrito um signo, para logo depois esquecer uma pausa, quando tive de escolher um destino.

E devo ter seguido à direita ou à esquerda, subido ou descido; ou talvez até em breves momentos em terreno calmo e plano caminhei.

Mas daqueles signos e daquelas pausas tenho hoje a afeição de um pessoal eu, e as marcas de um destino com as características e os detalhes adquiridos pelos sentidos, exercidos com observação e disciplina.

Por ser contemporâneo de um tempo romântico nesta cidade, meu coração insiste em recordar cada palmo de chão que nela percorri.
Ainda aí estão as ruas, embora alguns edifícios tenham sido derrubados, outros infelizmente ruíram.

Durante a noite retorno a estas paisagens em sonho, mas sempre uma apreensão me é constante na hora de voltar para a minha hipotética casa, à qual nunca sei como retornar por não saber quem seja aquele eu, que sonha e não tem sequer noções do endereço.

Talvez a causa seja por não ter grandes pretensões materiais, nem fortes apegos a que persiga.

Também já não vivo razoável estabilidade emocional provocada pelo eixo do entusiasmo, nem a sonhos belos não mais embalo à noite, senão o silêncio cautelar e um pouco de poesia.

Mas seja qual de mim exista nesse espaço noturno que nem sempre é reflexo do dia feliz, raras vezes tenho sonhos claros.

Penso então no conceito de Maia Budista, segundo a qual tudo no universo é ilusão; e como estou e vou neste mesmo verso, não seria mesmo possível ser real nem ter sonhos preciosos em lugares reais, se eles não existem, nem eu na totalidade do individuo perceptivo!

Mas naturalmente diferente da ciência neurológica, que anuncia muitos eus e nega um ego individual, enfiando no mesmo mote de sua fundamentação as idéias filosóficas do budismo zen.

Não é verdade que o budismo tradicional defenda essa crença, de que muitas manifestações de naturezas diferentes se manifestem, enquanto entes independentes da consciência de um ser, que não teria identidade nem seria um ego real.

Nesse caso também a consciência do ego não poderia existir, por absoluta falta de uma identidade central que se reconhecesse no dia seguinte, por exemplo, como aquele mesmo sujeito de ontem.

Pois tendo mais de uma entidade ou múltiplos eus “semelhantes a uma prateleira” a brincar de guardar indivíduos... seria a já de hoje prateleira coletiva convertida num arquivo, de muitos eus?

E mesmo que se fale em egoísmo e coisas do gênero, o cérebro, no caso é o centro de convergência onde se processa a ação, que dá origem à consciência, mas não é a entidade.

E quando algo individual que naquele conceito científico não existe e não é nada, mas voa dali e o cérebro cessa as atividades morrendo com o resto do corpo, o que afinal era o ser pensante antes da morte e partiu, ou morreu?

E em nome de quem antes da morte e enquanto cidadão aquele que a tal pesquisa fizera e a tal teoria defende se identifica e reclama os seus direitos de autor? A qual seu eu estranho ele seleciona?

Que o universo segundo o conceito de Maia é uma ilusão, é perfeitamente compreensível, posto que deixe um dia de existir, assim como a saudosa rua por onde um dia passei!

Mas há alguém e no caso sou eu recordando aquela rua; e até sinto uma infinita saudade por ela! É evidente que eu não sei quem seja eu, mas sou. O quê, pouco importa!

Todavia o mais importante é saber e eu sei, hoje tenho mais consciência do que ontem do exterior e do interior, sem a confusão de ser este ou aquele que percebe, pois, sou sempre eu.

Alguém evoluiu dentro de mim e eu mantenho a consciência de que sou o mesmo de ontem, e estou aqui a aprender com a experiência.

Devo ser então um centro específico com uma função universal, sem precisar recorrer à memória para saber qual dentre tantos eus fui ontem para saber quem sou agora, superando as expectativas de uma ciência materialista que me condenaria à “massa cerebral” ou no máximo a uns diferentes centros de relativa consciência autônoma, entre vários seres anárquicos; ou à prisão de um cérebro, se eu fosse o que eles dizem.

Sim, há algo indecifrável no cosmo, que a ciência por mais avançada que seja não desvendará, enquanto não mergulhar profundamente na causa que por trás dos efeitos se encontra.

Porque isto ela não pode negar: todo o efeito tem uma causa. Mas são tão incríveis esses profissionais da área! E como se apegam aos termos lingüísticos!

E até se esquecem e desprezam outros fatores, como por exemplo, no caso da regeneração do cérebro quem comanda por trás dos neurônios, a sua regeneração?

Uma natureza intrínseca, dizem eles, mas de onde vem essa natureza? A resposta deles é a de que faz parte da própria natureza e aí se sucede a mesma pergunta girando em círculos, sem se darem conta de quem neles mesmo debate o assunto, até que se rompa e se chegue ou esbarre na causa das causas, mas que eles por teimosia negam.

Pena esta causa ande ainda muito distante da mente concreta destes senhores!

Pois de todas as experiências vividas resultará sempre uma recordação em alguém, por trás dos neurônios, e que poderá ser afetada se estes forem lesionados no espaço cerebral reservado à memória, por ser o cérebro o processador das informações, mas este mesmo cérebro jamais será o senhor da consciência.

O ser que vai oculto enquanto ego superior paira sobre o inferior, enquanto este não despertar para a sua realidade universal e é quem mais ou menos usa as regiões cerebrais e seus habitantes, que são os neurônios.

Já a consciência, enquanto centro, representa a quantidade de informações acumuladas ao longo do tempo de todos os fatores, tais como: conceitos, teorias, educação, formação, religiosidade, espiritualidade, alimentação, conceitos de bem e de mal, etc.

E é o que ao fim resulta como entidade (ente civilizado) individual, mas em conjunto forma a civilização global afetada pelos conceitos dominantes, tanto científicos quanto religiosos, tanto políticos quanto educativos e sociais, numa forma mental coletiva ainda muito atrasada, enquanto modelo.

Mas que em cada indivíduo haverá uma representação diferente, não obstante o cérebro ser igual em todos e a substância única que lhe dá a forma, sim, haverá!

Em mim, porque a poesia insista em fazer porto, mesmo eu não estando apto a satisfazê-la, a saudade revolve-se em nevoeiro noturno, fragmentada em lances recortados por imagens confusas.

E quando sonho quase sempre me encontro perdido, ou tentando escalar pelo lado mais difícil a um obstáculo intransponível. E ao voltar para casa nunca sei onde moro, nem conheço o caminho de volta.

Em resumo, diria andar sempre perdido em meus sonhos, com apenas uma certeza sentimental: tanto acordado quanto sonhando sinto nas profundezas da alma uma infinita saudade. E quem sentirá essa saudade?

Se eu tivesse que definir um ser a mim semelhante para além dos conceitos científicos e dogmáticos que sobreviva após a matéria, o chamaria de saudade, ente saudade, mas já sou um, dentre tantos hipotéticos outros.

Isto naturalmente em metáfora, já que ao espírito não é possível negar, enquanto substrato, ou essência ainda desconhecida do conjunto ego, do qual momentaneamente sou um depósito de saudade em estado de consciência, aportada e processada no cérebro.

Por isso minha casa parece estar muito longe daqui ou de mim, por não ter havido, quem sabe, a realização de algum desígnio carmático.

Mas sinto estas coisas mais que as sei; aliás, não sei nada! Minha imaginação estacionou à entrada de um túnel, no qual pressupunha ao final encontrar raros conceitos e luminosas idéias, que me conferissem alegria e alguma realização pessoal, mas não pude seguir em frente, porque se fechara nos limites da minha inteligência, ainda pouco desenvolvida.

Sonho também de vez em quando com água, barro e lama a servir-me de caminho, que nem sei se é mesmo caminho, por não ver horizonte à frente.

Diante desse quadro haverá quem pergunte: - quem é esse desgraçado? E eu respondo: - sou um eu confuso e atormentado, sim, em busca de uma identidade real, mas um ego que de alguma maneira prova que um ser é algo muito acima de um conceito lingüístico, e jamais uma ilusão passageira entre neurônios, que até se regeneram, se extirpados.

Sou, enfim, como qualquer um, uma alma inquieta dentro de um corpo já meio velho e cansado, protótipo de um ego universal tríplice, cujo espírito seria a suprema inteligência em mim limitada, porque vá sendo vertida por um minúsculo orifício, cujo limite me permite compreender apenas o óbvio, na triste condição de um ser ordinário, ou acorrentado Prometeu.

Como poderiam então haver sonhos belos, a meio a este perdido caminhar noturno e raras vezes colorido?

Mas estou atento e alerta para com os modernos sábios, porque desconheçam e mesmo conhecendo-os desprezam os velhos iluminados.

Evidentemente porque falam muito e até defendem teses pela televisão a milhões de telespectadores...

Mas quando digo que eles sabem pouco ou nada, é porque ninguém sabe muito, diante do mistério que envolve o porvir... E porque seja este apenas o verso do verso de Deus!

Mas além do mistério que envolve a vida, no conceito mais elevado que não está ainda ao alcance dos homens, há esperança de momentos mais felizes para a humanidade.

Ainda que ande à mercê de cantos estranhos e crenças fantasiosas, em vez de obedecer aos impulsos internos, que ao longo do tempo invisíveis e silenciosamente veem construindo o indivíduo, poeticamente um ponto de luz em meio às trevas da maya.

Mas ainda agora prefere seguir a cabeça de um líder ou de um ídolo, cujo resultado final está muito claramente escrito, muito bem representado num trágico quadro, cujo retrato em preto e branco predomina a cinza – na cor mundanal.

Mas onde todos imitam todos, e o mais esperto tira partido e explora o próximo, sem o menor constrangimento, o que poderíamos ter?. Tal é seu estado de consciência perante a real essência da vida, que absolutamente ignora.

Assim procede ao intelectual, por regra fundamentando seus argumentos num autor que se aproxime de sua compreensão e entendimento, numa espécie de ciranda onde não é necessário pensar por si mesmo; mas citar, citar e citar desde que o citado tenha citado outros, que por sua vez fizeram citações.

Parece que ninguém mais quer raciocinar e criar novos conceitos que irão modelar novas formas de arte, de ciência literária, nova maneira de agir sem, todavia desrespeitar os sábios de todos os tempos, ora também preteridos por outros duvidosos e modernos, mas sempre muito citados.

Pessoalmente não serei eu também exemplo de nada, por estar a viver dos fragmentos mentais de minha memória, cuja sensação mais lúcida é meramente uma tremenda melancolia, que já nem sei se é mesmo saudade. Porém indignado com o andar do mundo.

Compreendendo-se por mundo as pessoas que nele fazem espécie, e causam, em nome da arte e da ciência desconcerto e intolerância, materializados em tremendo estouro de violenta carrada de pedras, em cima dos mais fracos e pobres.

Para que o fútil na mídia se mantenha e o tal cidadão faça seu discurso científico, outra venda seu peixe político, ou o seu deus aos bocadinhos.

terça-feira, 8 de junho de 2010

INCONSCIENTE

Pessoalmente sou uma imitação grosseira da vida de um deus, de algum modo falo imitando a palavra de um sábio, por ter sido sábio aquele que inaugurou a fala ordenada, e quando sou bondoso imito a santidade de um santo. (Acho que é mais ou menos isso.)

Mas compreendo hoje melhor do que ontem que a palavra não diz por si mesma muita coisa. (Mas pode dizer tudo que se possa ouvir.)

Já o silêncio sim, poderá traduzir e talvez seja a única maneira de perceber o que realmente existe como essência. Ainda que se trate de uma pálida sombra, de alguma limitada realidade.

Sim, o silêncio às vezes frio e cruel como um escuro ancestral, mas de onde de repente ante a fraca luz de uma lanterna mental, brilham olhos de estranhos e pequenos animais assinalados em nossa mente.

A lanterna é a nossa única consciência possível, dolorosamente iluminando os relevos de alguma coisa sólida ou móvel conhecida da triste realidade que nos cerca, e mal compreendemos onde a natureza absolutamente desconhecida se deixa observar, e nós fingimos desvendar.

E se nesta fase de o dizer coloco a frase no plural, falo só por mim, envolvido no silêncio noturno da minha ignorância, porque não saiba nem tenha consciência ou sentimento pessoal do que seja a vida integral.

Vida de verdade e não mero conceito de um tradutor universal! Pois nem Cristo ou mesmo em momentos em que o sofredor Crestos se manifestou em meu peito em heroísmo se fizeram inteligíveis ante essa incógnita, que os insensatos ousam largamente interpretar.

Imaginá-los e até ouvi-lo aos berros pelas ruas em distendidas eletrônicas asneiras anunciando a revelação desse mistério e a redenção de todos os males, causa tremendo espanto!

Mas depois do espanto e já refeito do surto de burrice a que fora acometido diante de tamanha grandeza desses gritos, compreendo, pela classe de pessoas que se identificam, nítida e cristalina a sua intenção, e o que pretendem se revela claramente, nas promessas que fazem e nos produtos que oferecem.

E ao vivo carimbam com a sua marca forte de que até o sagrado silêncio está sujeito aos seus ataques repentinos, com ofensivas palavras!

E assim, ao deixarem de ter sentido as sentenças dos sábios, não se tem mais como classificar o som com a cadência e ritmo da voz humana, e já pouco revela em voz amiga e familiar.

Por isso é que sou mesmo a imitação da vida, se a dos falsos profetas for verdadeira.

Conquanto exista sempre um meio termo entre todas as coisas, demarcada por um frágil ponto nota-se já a raiz da esperança.

Sim, porque continuo existindo eu e continuam existindo eles. E é assim que nós vamos a navegar nesta nave maior, mas já não tão grande que se não possa medir, pesar e contar-lhe o tempo de vida, e até se pode parti-la aos pedaços!

Isto se for nosso entanto o de apenas com a carne alheia nos divertirmos. Pois, desgraçadamente ainda não compreendemos que mesmo que não pensem todas as outras espécies, instintivamente vão a fugir de nós. E por que fogem de nós?

sábado, 5 de junho de 2010

“A Verdade”

“Ninguém que ouse dizer sempre a verdade, arrepender-se-á de ter nascido entre os mentirosos”. Filosoficamente, é correta semelhante sentença, por se destacar quem diz a verdade, entre mentirosos?

Talvez. Todavia necessita de uma reflexão mais profunda. A princípio, quem conhece a verdade? E aquele que vive dizendo só a verdade, que verdade derradeira ele defende?

É evidente e impossível viver de outro modo, que não seja entre regras e conceitos! Conquanto todos os modelos e normas sendo relativos, e eles é que determinam particularidades e características do homem, pessoais e indecifráveis, e as suas “verdades concretas e abstratas” resultam desse ritmo.

E através das “regras e dos conceitos” é que se formam as características do individuo e da personalidade, resultado das idéias e dos sentimentos, que ao longo do tempo criando corpo personificado se torna a marca inseparável, que a civilização diferencia e classifica por indivíduos.

E se a verdade de cada um até na visão das cores, se diferencia, resta a verdade como preceito único de que há algo indecifrável no Cosmos, e enquanto verdade tangível é mesmo indecifrável e é inútil discuti-la.

Como então dar garantias de algo verdadeiro, criado pelo homem? E quem se julgue profundo conhecedor dessa verdade, não será esse cidadão apenas mais um, dentre o contingente de mentirosos, conscientes ou inconscientes?

De qualquer modo vale a pena viver entre eles e aprender, e como opostos reafirmando-lhe sempre a imutável ética, ainda que esta norma sadia seja relativa e até momentânea, mas promove a harmonia.

E então, diante disto, resta a todos que ousam, ainda que restritos às suas limitações, ir além do raciocínio e investigar a “causa” das causas, pois aí, sim, repousa a única verdade, por ter dado origem a todas as “mentiras”.

E até se pode vê-la quando revelada em mero conceito, pois qualquer que seja a formulação conceitual não se poderá garantir, nem negar, e ainda que uns aceitem e outros não.

Sim, a verdade humana passa, e hoje, por já não ser ontem já é mentira, se porventura como ideia for tida como absoluta reprodutora de uma cópia para o amanhã...

E então a questão da verdade absoluta permanece sem resposta, encoberta e até condicionada a fragmentos perecíveis, usados por aqueles que arrebanham e guiam por caminhos improváveis, a tantos inocentes, que a verdade fica cada vez mais distante, no tempo, porque se perca e desfigure, e no espaço, porque se contraia tornando-se relativa, pequena e finalmente desfaça-se em pó.

E onde continua a existir a verdade? Calar-se-ão os que pensam, ante os berros dos mentirosos? Ou, se pensam hoje com fundamentados argumentos, não mais continuarão a pensar e a falar amanhã?

Antecipando-se hoje no tempo calam-se porque seja hoje cedo, ou porque já está no passado o ontem, e fora de moda?

Pensem bem! Pois embora os que pensam com intelecto bem formado não conheçam a verdade, estão mais próximos dela, porque pensam bem e fundamentam a ética e moral em bases mais sólidas de conhecimento, durando mais tempo, por estar de acordo com a harmonia da vida múltipla, mas com um visível elo de unidade.

É então certo que, na “expansão das idéias”, o egoísmo e a ignorância as retraem, mas, estranhamente sempre em nome de qualquer verdade!

Abominamos então o egoísmo e a ignorância! Sendo obrigatório e dever de quem pensa bem exercitar-se nessa arte, cada vez mais e melhor e combatê-los, evitando maior estrago causado por aqueles que agem sem pensar, denunciando de boca a ouvido os egoístas mais iminentes, e aos menos também.

Principalmente aqueles que se encontrem pelas redondezas, mas quem pensa, porque pensa bem, não os poderá julgar, nem crucificar, embora muitos o mereçam!

Sim, quem pensa bem não tem mesmo tempo para inocentar nem condenar ninguém, envolvido com a “causa” das causas, ao que se convencionou chamar “busca da verdade, embora a indignação lhe seja facultada.

Por isso é mais dilatado a caminho de quem pensa, vê e observa, mas erra profundamente aquele que se cala, depois que descobrir algo que ilumine a obscuridade e um caminho novo.

Pois sabe como ninguém a maneira correta de dizê-lo, mesmo que o seu dizer e saber sejam a consciência de que em definitivo também não sabe nada!

Mas porque pensa, não deve calar e às vezes se cala, mesmo vendo com clareza que continua sendo à “expansão das idéias” o sutil egoísmo e a rude ignorância o seu principal obstáculo, que até elege outros obstáculos presidentes que obstaculizam o caminho da evolução pátria.

Por outro lado, ainda as escadas do conhecimento, de tamanha sutileza, passam invisíveis para muitas escolas: nas ciências acadêmicas, por exemplo, quando uma ignore a outra, certamente transformar-se-á em egoísmo mental, porta intelectual fechada para outras idéias e conceitos, constituindo-se a cadeira à qual pertença a sua cátedra modelo sutil de egoísmo, ou um autentico moderno catedrático, estilizado em doutor.

Não obstante sua única cátedra lhe confira, digamos, a visão de um só olho “manquejando” do outro, para usar a expressão terrível de Camões, e encerrar por aqui este “pano” que daria para muitas mangas.

quinta-feira, 3 de junho de 2010

E VOCÊ?

PROSSEGUINDO COM AS PROSAS... SEGUE ESSA PROVOCAÇÃO.


... “Como é possível prosear em dó, se em ré é que se vai a remar contra a correnteza das águas, que é na verdade contra a maré”?
Certa vez fizeram essa pergunta a um sujeito muito sisudo, mas de ares pacíficos, que participava de uma conferência da paz.

Meio sem jeito e a contragosto, ele respondeu:- prosear em dó ou em ré não faz diferença, desde que a água das chuvas não leve sequer uma vírgula, das prosas em sol.

As pessoas da plateia, surpresas, olharam umas para as outras sem compreenderem nada; afinal, quem fizera semelhante pergunta só poderia tê-la feito sem pensar!
Teria também o conferencista respondido sem pensar? Indagavam as pessoas entre si, surpresas pela graça inusitada daquela conversa meio maluca.

Entretanto o orador já refeito e com um sorriso maroto entre dentes, quase adivinhando o que o público pensava e queria ouvir, tornou: - devo esclarecer melhor a questão, pois noto que os senhores que ouviram não entenderam muito bem a pergunta, nem tampouco a resposta.

Prosear seja qual for o tom, nem sempre valerá a pena, nem mesmo em verso. Já ouvir, sim. De natureza solar, sim se deve ouvir muito!

Quanto às chuvas de verão, às vezes tempestades cuidemos para que não levem sequer uma vírgula, ainda que seja uma pausa entre duas asneiras torrenciais!
A platéia continuava curiosa, sem entender, mas parecia gostar da prosa, pelo semblante alegre, que ali reinava...

E ele, sensível e habituado com o público, notando o clima positivo prosseguiu com a palestra em forma velada, que será traduzida e revelada no futuro ainda não determinado, quando então será bem entendida, e muito bem fundamentada, mas realmente só qualquer dia desses.

No momento as palavras permanecem ocultas germinando, numa estufa fria de rigoroso inverno, para serem aí conservadas sem contaminação e em futura primavera, expostas ao sol depois de bem arejadas e já crescidas aí sim, possam ser pronunciadas numa venturosa manhã, quando bons ouvidos alerta lhe renderão honras e o denso nevoeiro que povoa as mentes se dissipando, seja definitivamente eliminando.