Personagens meio metafísicos
e meio humanos encontraram-se numa biblioteca e começaram a conversa enquanto
aguardavam a hora de voltar, quando Ela
pergunta:
Ela – Que fizeste àquela linda melodia e à tua gaita que à noite solitária e
enlevada do meu quarto a ouvia, quando tocavas no teu jardim, meu bom poeta?
Ele – Já nem me lembrava de que toquei um dia esse instrumento! Ainda bem, tu
me lembraste! Mas não sei se era realmente bela a minha música!
Ela – Sim, de ânimo levantado tocavas belíssima melodia! E também te ouvi
certa feita dizer que não gostavas do canto da cigarra!
Ele – Não me lembro, embora ainda hoje não goste
do canto da cigarra; realmente neste momento falha-me a memória e não me lembro
do que te disse!
Ela – Disseste
tanta coisa interessante! E fez-me muito bem o que disseste! Talvez falasses o
que eu precisava ouvir!
Ele – Como é isso?
Falei o que precisavas ouvir sem saber que o dizia? Desculpa, mas isso me é
estranho e espantoso! Pois no presente nem do que ando a fazer eu me lembro!
Confesso que nem sei o que dizer.
Ela – Diz o que
quiseres! Tens o dom da palavra e és poeta! Em nome da arte e do belo não cala,
que a tua fala além de bela também liberta! E quando não liberta tem o dom de
alegrar ao triste!
Ele – O que dizes? A minha pobre
e inculta palavra que nem sempre eu próprio desejo ouvir de tão ignóbil, alegra
e liberta? A quem eu libertaria?
Ela – Isso eu não sei exatamente! Talvez alguém ansioso para ouvir a si mesmo
e sem coragem de ouvir-se seja atingido com as tuas palavras e desperte! Talvez,
mas também não sei!
Ele – Atingir alguém com a minha palavra? Não creio que eu seja um atirador;
tampouco guerreiro da palavra; não sei como haveria de salvar alguém apenas com
a minha voz!
Ela - Não, tu não és carrasco da palavra, nem és e nem precisas ser um anjo!
Tampouco demônio ou Deus! Porém, meu bom poeta, tu podes combater o bom combate
com a boa espada do verbo; e também porque ousas sonhar! De repente são os teus
sonhos que convertidos versos andam a libertar!
Ele – Como se não bastasse à triste sina revestir-me de poeta, terei de arcar
com o fado de um sonhador? Não, não creio aos meus versos construídos de sonho
salvarem a alguém! Não! Se o que eu sonho até a mim anda a prender! De tão banais
a mim próprio custa-me sonhá-los! E por não poder evitá-los até me andam a
aporrinhar! Não, não pode ser verdade!
Ela – Sim, em homenagem à língua te digo que sim, pois o jardim onde
florescem os teus sonhos sou eu! E ao sonhá-los, os recitais em mim!
Ele – E quem és tu, afinal? Embora de mim mesmo pouco saiba, eu quero saber
quem és tu! Neste momento, imperiosa e poderosamente necessito conhecer
qualquer coisa de ti!
Ela – Ah, eu sou teu íntimo! E tu em mim és a gênese da alma... Apenas alma!
Por isso não podes olhar-me nos olhos, porque eu sou o mais profundo do teu
olhar! E não poderia ser tua fêmea, nem sou mulher!
Ele – És então metafísica entidade?
Ela – Sou apenas metáfora de ti mesmo para que um dia ao olhares dentro de
ti, aí me reconheças. E se nesse dia quiseres em minha pátria o teu bem mais
precioso guardar, digo-te então que sou a tua anima, e também o hálito que em
tuas narinas ando a soprar...
Ele – Nem sei o que dizer! Mas como posso sentir-me autor dessa arte que
dizes andar a exercer, se não sei o que sou nem o que tenho e quase sempre o
sim é não! Desta estranha revelação não sei o que responder! Entretanto,
diz-me: o mais elementar princípio de uma personalidade que se revela tem um
código pessoal: terás tu um nome?
Ela – Interiormente, a primeira parte de tua indagação sabes muito bem a
resposta para todas as coisas que perguntais. E sabeis bem o que quereis.
Então, confia! Quanto a ter eu um nome é o meu ser oculto, e ainda uma
criança... Atreve-te a trazer-me à existência plena e chamar-me-ei, nesse
instante, só nesse instante, consciência. Mas depois desse momento glorioso
para sempre te lembrarás de mim, e esse será eternamente o meu nome!
Ele – Quão bela é essa revelação!
Numa única palavra declaras a maravilha das maravilhas, Consciência! Eu
precisava ouvir essa sinfonia perfeita numa única palavra!
Ela – Sim, essa é a mais pura e bela expressão no sublime jogo da
“conquista”! Quem busca o eixo e o eu real, encontrara a Consciência! E quando
ela reinar, quem sob seus auspícios andar, nunca mais há de andar sozinho nem se
sujeitará às fraudes, nem às mentiras... É por excelência essencial a voz do eu
luminoso, e vai muito bem guardada no âmago de cada eleito.
Ele – Quão bela e rica síntese
fonética! Preciosa essência, perfeita, numa única palavra! Nela revela-se toda
a beleza e fortuna de nossa língua! Nem carece dizer mais nada. Apenas
repetir... Com/Ciência!
Ela - Silenciemos então essa maravilhosa semente em nossos corações e em
nossas mentes, para que cresça! Pois também já é a nossa hora de voltar! Ou
seria, de acordar?
Júlio,
ResponderExcluirO texto de hoje me levou a 2 frases de Alan Moore:
"A ciência (atual) não pode lidar com a consciência nem testar pensamentos, então tenta reduzi-la a eventos químicos e físicos."
"The Mindscape of Alan Moore":
"A Arte é, como a Magia, a ciência de se manipular símbolos, palavras ou imagens para se alcançar estados alterados de consciência."
Alan Moore
Mais aqui:
http://textosparareflexao.blogspot.com/2009/06/o-verdadeiro-eu.html
(O Verdadeiro Eu)
Boa sprte, Norma
Como não conheço essas frases, não as plagiei rsrsrs
ResponderExcluirEu coloquei um linque. (textos para reflexão)
ResponderExcluirOcorre que a plataforma Blogger obriga a copiar e colar. Não te direciona automaticamente.
Qdo puderes dê uma olhada no Verdadeiro Eu.
Alan Moore é conhecido...
Boa Sorte
Dei uma lida e gostei muto!!!
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