O
tempo passou. Mesmo sem existir, o tempo passou. Se realmente existisse e
tivesse consciência de sua existência, certamente contaminado pelo pensamento
do homem que o inventou e a tudo quanto toca contamina, passaria escarnecendo a
envelhecer tudo com raiva, sem se importar de envelhecer encaminhando à morte
o que tocasse com requintes de cinismo, por não ter compaixão nem senso de
permanência com a sua criação, exatamente como faz inconscientemente sem saber
o que faz.
Amoroso,
o tempo? Com a consciência que lhe emprestasse o homem para que não eliminasse tudo
pela VELHICE em sua passagem? Esse homem que destrói a outro Homem que ouse
declarar amor pela humanidade? Vale a pena fazer semelhante pergunta só para rir!
Não do tempo, mas do homem, claro! E é claro também que rogamos perdão às
pessoas boas que vagueiam entre a turba distribuindo caridade e compaixão...
Sim, a vós que por vós vale a pena a vida, perdão por estas minhas palavras
duras.
Mas
voltando ao tempo, não obstante a sua inexistência, todas as coisas com forma, enquanto
existem possuem uma ética imutável e inevitável, que perante a morte marcam a numa
espécie de olhar pra trás num adeus na passagem de um estado para outro: do
bruto para o sutil, do sólido para o líquido... Nessa plasticidade que as
substâncias orgânicas animadas possuem, quando se decompõe a estética de uma construção,
para recompor-se noutra e isso é muito bonito do ponto de vista da natureza “naturada”
a converter-se na passagem em “naturante”.
Poderá
ser até através de um artifício inventado pelo homem, uma arma, por exemplo, ou
via natural; porém sempre através do ritmo e movimento temporais, pouco importa
que de forma trágica ao sofrer o impacto de um petardo, no caso de alguém ou
alguma coisa indesejável que se queira eliminar.
A
morte é sim a ética natural a todos os seres vivos. Ora interrompe o sofrimento,
mas também interrompe na flor da idade à alegria, sem se ter certeza do que
seja realmente a vida. E na mesma medida, também o que seja a morte que sobreviva
e se imponha à tristeza ou à alegria de quem observa essa transformação.
Mas
enquanto não chega “aquela” que a mim se dirige e teve início tão logo saí do
útero materno, faço-lhe muitas indagações, pinto-lhe inúmeros retratos em
quadros abstratos, crio e recrio conceitos e teorias, descrevo-a em poesia e
prosa, embora da vida em si não saiba mais do que ter ela um final, como tudo no
mundo tem num rito de apagar e fechar os olhos.
Quando
cessa o rítmico coração e em seguida sobrevém absoluta quietude para quem vai, as
lágrimas dos parentes e amigos que ficam operam uma leve passagem da água
interior nas lágrimas, enquanto o levam à cova ou ao crematório.
Quando
se pressupõe tenha dele voado algo vivo e alado, embora ninguém o tenha visto;
mas alado, senão como voaria, se é que voou?
Poder-se-á
também dizer que tão logo expire o último hálito arrefeça, para em seguida
enrijecer, quando aquele ente dito feito à imagem e semelhança do criador
tivera pela dinâmica da inércia passiva, eliminado o físico de acordo com as
circunstâncias das energias que perdera desmoronando-se, deixando de se manter
animado e inteiro; e a alma, e supostamente o espírito não estendo mais por ali,
onde terão ido? Esta é a grande pergunta, tanto para os místicos e fervorosos
crentes, quanto para os leigos.
E
muito especialmente para os filósofos, a quem a morte constitui ainda grande
questão sem enunciado à vista descartado completamente o conceito de céu e
inferno.
Poderia
recorrer a meu atrevimento e responder a esta pergunta de acordo com o meu
conceito, mas seria mais um conceito dentre tantos já escritos, falados, ditos
e alardeados e até comercializados. Por isso não vale a pena, pois seria mais
um conceito.
E
poder-se-á resumir o que já existe historiado entre as várias correntes, onde uns
apontam para a imortalidade da alma, outros para a imortalidade de espírito, e
ainda para outros a prerrogativa da alma se unir ao espírito, quando a mesma alma
se imortalizaria na morte.
E
seria o ato de a ele se unir a suprema ética, da qual resultaria a sua
imortalidade. Pessoalmente creio nesta hipótese como conceito estético da
suprema e pessoal conquista por esforço próprio, mas não após a morte; esta
conquista só poderá ocorrer em vida, tornando-se nesse momento – e nisto reside
a suprema estética – um verdadeiro Prometeu libertado, que em vôo triunfal
levaria consigo a sua amada Psique.
Se
o fizesse, evidentemente, como Eros! Porquanto não seja isso aquilo, mas apenas
enquanto isso isto, e nada mais.
E
por enquanto e de acordo com o que já se sabe a respeito, só isso mesmo... (Pois
nunca isto nem tampouco aquilo será de outrem qualquer coisa mais do que é cada
um para si mesmo!)
Nenhum comentário:
Postar um comentário