quarta-feira, 1 de julho de 2009

ENIGMA DAS PORTAS

Fecharam-se todas as portas da terra uma após a outra, até todas completamente cerradas furtarem todos os ânimos com que poderia abrir as do céu. Encerrado neste arcaico pote, o que farei? Envelhecendo, nem o tempo confere já um tom artístico que até uma velha lata amassada contém! Absolutamente decaído, sou o rei deste meu reino passageiro, de portas fechadas.
Não abri as metafísicas do entendimento em tempo hábil, e estou preso a este complexo ser cujo corpo corruptível leva-me à morte, caso seja realmente mais que este corruptível, mas sem ter aonde ir, por não ter sequer aberto janelas.
E de portas e janelas fechadas, não há espaço nem caminhos para ir aos floridos campos da imaginação, de encontro a qualquer enlevo de saber e de esperança, quanto a desvendar o enigma da vida. Desta, então, não mais do que farrapos pendurados no cordão das vistas, por onde já nem descem lágrimas; mas, vejo por elas como único prêmio um quadro pendurado na parede, cuja moldura em cipó de jasmim lembra com o seu perfume abstrato, o único refrigério de espírito, e a suprema e pobre arte; e a única parte, talvez, de uma cena onde posso imaginar esperança. Mas ainda assim, apesar de todas as portas fechadas e não ter aberto as do céu, creio na suprema beleza do espírito em tudo que possa imaginar meu, porque tenha me intuído enquanto executor; e, igualmente a todas as coisas de outrem, e do mundo consagro como suas...
Por isso não há mágoa porque seja eu, eu cujo destino ou carma pessoalmente o tenha tecido; não obstante desacreditar em sina! E, como tal ser apenas o que sou.
De modo que, congênito ou carmático não creio ser totalmente responsável pelo que fiz ou deixei de fazer, resultando no fechamento das portas. Reparto a culpa, se a houver, com outros eus em mim arcaicos. Também já não me importo saber se alguém se interessa por portas fechadas ou abertas. Digo apenas que semelhantes portas rebaixadas ou elevadas das metáforas para a vida real são os sentidos a serviço das faculdades sensitivas e cognitivas, que ao longo do tempo edificando a consciência vão engajadas dentro de uma personalidade, adquirindo nesse ínterim uma carcaça ou pote perecível e descartável... Ou não? (...)
Mas, em verdade tem em tese este enredo como meta abrir as portas do céu, subjetivas, naturalmente, sem que se as possa denominar psicológicas no sentido clássico do termo, embora físicas elas realmente não sejam; tanto aquelas hipotéticas e as de madeira, quanto as de ferro...
Abstratas ou metafísicas é a melhor expressão para aquelas que realmente definem a universalização da consciência, enquanto cânone... (ou enquanto de alguma forma... portas)
É mais ou menos isto o que representa a parábola portas abertas ou fechadas da terra, abertas ou fechadas do céu.
Estando muito claro para quem as abriu ou pretenda abrir, que para isto muito pouco conta a fé.
O método clássico tem como primeiro passo a audição, seguida muito de perto pelo silêncio; e, coroando de êxito todo o processo, a atenção, antes de entrar ou sair por uma porta. Este primeiro exercício visa fortalecer e adquirir vontade e disciplina para com elas aumentar a sensibilidade, primeiras chaves que se encaixam nas fechaduras das portas...
Daí em diante há de se buscar o método pessoal, pois não sei exatamente o quê nem como seja o retrato da alma; porquanto também saiba ninguém ter competência para dar-lhe conteúdo; julgá-la, então, humanamente impossível!
Mas é ela para mim, no momento, apenas uma página transitória de história a passar por em minha frente, não sendo totalmente minha nem eu, eu. Talvez mero retrato instantâneo de um ser tão complexo, que a maior tragédia está em não haver ontens. Porém tragicamente triste, é ver ruir o mundo, tão sólido!
Desabar estupidamente sem esperança de amanhã, só porque os ontens foram trágicos e também os hojes ainda os são! Infelizmente o horizonte não sorri para que aos seus dentes de marfim vejamos brancos, branquíssimos.

MAIS UMA PORTA
Dizem que, para cada porta que se fecha, deus abre duas... Mas eu não acredito. Sendo o diabo que as fecha, segundo a crença, não andaria por aí deus reabrindo-as com tantas coisas para fazer na direção do universo; e do mesmo modo o diabo, em vez de andar por aí a fechá-las. E também porque raras vezes não se bate à porta de alguém que não venha atendê-la uma pessoa assustada, mal humorada, ou desconfiada até da própria sombra, que dirá de quem á sua bata!
Mas caso a abra, estaria então ali deus em forma de gente assustada, abrindo-a?
Portas concretas ou abstratas não se abrem com magia, senão com as mãos ou com a inteligência. E deste modo temos portas magníficas, tanto abstratas quanto concretas, além do que, portas são portas e tanto se abrem para deixar entrar o indesejável, quanto se fecham para reter quem se deseja que dentro permaneça...
Portanto portas são portas, abstratas ou concretas, abertas ou fechadas, por onde se entra e sai ou deixa de entrar e sair. Porque realmente portas são portas, de entrar ou sair.

4 comentários:

  1. Pois é,imagine deus e o diabo brincando de abrir e fechar portas, como se fossem dois seres infantis e desocupados!!!

    Bem, eu vim...

    Beijo

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  2. Menina do Rio bem vindíssima, amiga do coração. e que legal de comentário!
    Fraternalíssimo abraço.
    Viste o tamanho do talento que aqui escreve poesias?
    Sonetos?
    Nunca em vida vi nada próximo, e muito provavelmente depois muito tempo há de passar...
    Em branco

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  3. AQUELA PORTA!

    Portas há para sair
    e portas há para entrar,
    para tudo elas existem
    menos para eu te encontrar!

    Era preciso para isso
    bater à porta do céu,
    para onde Deus te levou
    sem o mínimo labéu!

    Talvez um dia, ao morrer,
    mesmo sem merecimento,
    me atreva à porta a bater,

    dando só como razão,
    além do teu chamamento,
    a voz do meu coaração!

    JOÃO DE CASTRO NUNES

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  4. E o mundo havia se findado, não existia mais ninguém, foi quando bateram à minha porta!

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